Neste dia internacional do livro, quero partilhar convosco o meu gosto especial pela literatura infantil e a importância que as histórias infantis têm em qualquer idade.
Cresci a ouvir ou a ler histórias e assim continuo em idade adulta.
Desde pequenina que tenho este gosto pela leitura. Lembro-me que, em criança, como não podia ter livros novos sempre que queria, lia tudo o que houvesse cá por casa para ler. Livros de receitas, revistas, jornais, bulas de medicamentos e até rótulos de embalagens. Verdade. Era o que havia. E, mesmo assim, muitas vezes repetia-se a leitura.
Só tive o meu primeiro telemóvel quando passei para o 7.º ano (precoce, no meu entender hoje em dia) e só tive acesso à internet a partir do 8.º ano. Portanto, não havia forma de ter acesso a novas histórias, novos livros e leituras frescas todos os dias. E os meus pais não me podiam comprar livros novos todas as semanas.
Recordo-me de ler vezes sem conta a história da Fada Oriana. Uma história pequenina, mas com uma forte mensagem sobre a importância de fazer o bem, de cuidar dos outros e de proteger a natureza. Esta mensagem definiu, em muito, a minha forma de ver o mundo e os outros.
Recordo-me de não gostar da história do Capuchinho Vermelho. Achava-a triste e assustadora. Tinha medo que o lobo me aparecesse também. Só mais tarde é que entendi a real mensagem da história.
Recordo-me de achar muita graça à história dos 3 Porquinhos. Eram tão fofos e redondinhos e ainda por cima tinham-se livrado do lobo de uma forma engraçada. Acho que os três porquinhos me salvaram do medo do lobo.
Recordo-me de criar as minhas próprias histórias, com os meus brinquedos, e essas eram sempre diferentes. Brincava muito ao “faz de conta” e inventava personagens, enredos, finais felizes e outros menos felizes. Tinha uma imaginação bastante fértil.
E já que falamos de histórias e de lembranças, a que mais me faz lembrar a minha infância e juventude é o Tom Sawyer. Não a tinha em livro, mas sim em desenhos animados e era fascinada por todos os capítulos. Aquela vida serena e calma no Mississippi. Aquelas paisagens verdes e tão naturais. Aquelas personagens tão puritanas e de bons modos. Ai… que saudades!
Note-se que sempre fui uma excelente aluna a português e, não querendo tirar o mérito às professoras que tive, as minhas notas em muito se devem a este meu gosto pela leitura.
Fomentar o gosto pela leitura em tenras idades é crucial para despertar o interesse pela literatura.
Hoje, já adulta, continuo a ler imensas histórias infantis. Aliás, a prateleira dos livros cá de casa é composta maioritariamente por literatura infantil.
Costumo afirmar que a literatura infantil, além de intemporal, é interessante em qualquer idade. As mensagens e valores que nos passam completam qualquer realidade, tanto a das crianças como a dos adultos.
De que forma é que as histórias são importantes no desenvolvimento da criança?
Sabemos que as crianças entendem o mundo de uma forma mais simples que um adulto. Para uma criança, uma história é a construção de uma imagem através das palavras. Mas, de que forma contribuem, de facto, para o seu desenvolvimento?
- Estimulam a imaginação, na medida em que introduzem novas ideias;
- Desenvolvem o vocabulário através das novas palavras que são introduzidas na sua linguagem;
- Contribuem para a aprendizagem de novos conceitos, mostrando o quão diverso é o mundo, as pessoas e as culturas;
- Ensinam a saber lidar com as emoções e a respeitar todos os sentimentos. Os nossos e os dos outros.
- Contribuem para momentos de relaxamento e descontração. Enquanto ouvem ou lêem uma história, o mundo lá fora e a vida real não existem. Os medos e as preocupações ficam do lado de fora da porta.
Além de todos estes aspectos positivos, as histórias ainda contribuem para o aumento dos níveis de confiança e autoestima. De que forma?
Quantas são as histórias de heróis e personagens corajosos que enfrentam os seus medos? Histórias de monstros que, afinal, não existem? Histórias do fantasma do escuro que, afinal, só vive no imaginário? Histórias de meninos e meninas que acreditavam nunca conseguir e que, no final, descobrem que de tudo são capazes?
Ao ouvir estas histórias, no imaginário da criança é construída a ideia de coragem, de força e superação. E estes conceitos são transportados para o mundo real, onde as histórias se transformam em lições de vida. Em idade adulta a situação é semelhante e falo por experiência própria. Quando pego num livro na mão e entro na história, construo imagens no meu imaginário através das palavras que leio. Associo situações reais aos acontecimentos da história e, muitas vezes, desconstruo e volto a construir ideias muito mais claras e concretas.
Além disso, ler faz-me viajar. Ler obriga-me a esquecer tudo à minha volta e a viver aquele momento presente. Ler faz com que o momento, o espaço e o mundo imaginário seja só meu.
Ler para os outros duplica o nosso gosto pela leitura.
Ainda não tenho filhos, mas quando tiver, vou adorar ler-lhes histórias. Ajudá-los a escolher um livro e a viajar no imaginário junto com eles.
O mais próximo que tenho da experiência de ler para os outros são as minhas sessões de conto, da história do “Paiva, o Gatinho Amarelo”, o que me dá um gosto enorme.
Mal começo a frase “E a história que hoje vos venho contar…” é ver aqueles olhares atentos, aqueles ouvidos bem sintonizados, onde nem um mosquito consegue interferir.
Mas não são só as crianças que ficam assim.
Eu, que conheço a história de trás para a frente, assim que começo a contar, desligo-me da realidade. A realidade passa a ser aquela. E de cada vez que conto a minha história, há sempre um qualquer pormenor que me soa diferente. Há sempre uma qualquer imagem construída no meu imaginário que é diferente.
Mas o que quero realmente dizer é que ler para os outros é de uma satisfação inexplicável. É levar os outros a viajar comigo. Todos no mesmo curso de água, mas cada um no seu barco. Todos na mesma história, mas cada um no seu mundo imaginário.
E é tão bom chegar ao final da história e ver as várias interpretações da mesma. Cada um interpreta a história e a sua mensagem à semelhança das suas necessidades na vida real.
E, enquanto adultos, cabe-nos a nós usar essas mensagens e explicá-las às crianças para que levem esses valores por toda a vida.
Como já referi no início deste artigo, sou uma apaixonada por literatura infantil. Já “devorei” todos os livros da biblioteca cá de casa, da biblioteca da escola onde trabalho e até os da Bibliomóvel. Agradeço ao Rui Guedes, responsável pelo projeto da Bibliomóvel de Penafiel, também ele escritor e apaixonado por literatura infantil, que me leva sempre uns livros novos e “acabados de sair do forno”, sempre que vai lá à escola.
Mas sei que ainda há muito para ler. Neste universo tão vasto de livros, há ainda muitas mensagens boas para colher. Muitas aventuras para viver. Muitas histórias para conhecer e recriar.
A minha sugestão para este dia internacional do livro, em que nos encontramos em confinamento, é que escolham um livro infantil e, mesmo que já o tenham lido, o voltem a ler. Sentem-se confortavelmente no sofá ou num outro espaço onde se sintam bem e deixem-se levar pela imaginação. Viajem através das palavras e vão sentir que o vosso imaginário começa uma construção de imagens.
E se querem que esta experiência seja ainda melhor, leiam para alguém. Deixem que os vossos filhos, pais, maridos ou esposas se juntem a esta atividade e leiam em voz alta.
No final, analisem todos, em conjunto, o que sentiram. Analisem as emoções e as mensagens que a história vos mostrou.
Boas leituras!